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Jornal Caderno Jurídico

Direito Tributário

A imunidade tributária em entidades após o julgamento da ADI 4.480

7/8/2020 às 19h19 - Gleison do Prado
Arquivo pessoal Gleison do Prado “Entidades que tiveram seus pedidos de certificação indeferidos terão direito ao CEBAS, podendo requerer a restituição dos pagamentos de contribuições dos últimos cinco anos”, explica Gleison do Prado, contador e estudante de Direito

O Estado Democrático de Direito, por meio da realização de políticas públicas, visa assegurar o bem-estar social. A problematização dos fatos, a formulação de alternativas e a tomada de decisão eficaz, eficiente e efetiva caracteriza uma política pública quanto a sua finalidade essencial, ou seja, mediar a relação entre Estado e sociedade quanto a sua finalidade de colocar à disposição da sociedade os direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal de 1988. Certamente, através dos recursos financeiros arrecadados por meio dos tributos, são executadas as políticas públicas em função do bem-estar social.

Aristóteles, discípulo de Platão, na antiga Grécia, afirmou que o homem é um animal político que se relaciona, e que a natureza humana é regida pela vida em sociedade. Partindo desta premissa, torna-se necessário que o homem promova a criação de estruturas políticas capazes de satisfazer as necessidades da sociedade e consequentemente o seu bem-estar.

O terceiro setor é constituído por organizações sem fins lucrativos, que têm por objetivo, atender as carências da sociedade, oferecendo serviços de caráter público. Logo, as entidades filantrópicas fazem parte do terceiro setor. Pautada nos valores sociais, as entidades sem fins lucrativos, nos últimos anos, passaram a construir sua própria identidade. São organizações que aperfeiçoam as ações do poder público, promovendo o bem-estar social. O terceiro setor está umbilicalmente ligado ao conceito de filantropia, que quer dizer “amor a humanidade”. As atividades das entidades filantrópicas são emanadas pelo altruísmo, ou seja, da vontade de proporcionar o bem, o desenvolvimento e a ascensão do próximo, o agir comunitário e voluntário para com o outro.

No cenário atual, os aspectos legais do terceiro setor sujeitos a imunidade tributária estão amparados pela Constituição Federal de 1988, na Lei número 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social, a LOAS) e na Lei número 12.101/2009, que dispõe sobre a certificação das entidades beneficentes de assistência social. Torna-se válido salientar, que a Carta Magna incentiva as entidades sem fins lucrativos através de imunidade tributária e isenções, para que auxiliem o Estado no cumprimento dos direitos sociais e na efetivação da ordem social. De maneira didática para fins de entendimento, torna-se necessário a explicação sucinta dos termos isenção e imunidade. Quando o Estado tem o poder de tributar, mas opta por não o fazer, na maioria das vezes com o objetivo de oferecer incentivos fiscais por meio da lei, tal procedimento é caracterizado como isenção. A imunidade tributária, sendo estabelecida pela Constituição, não pode ser revogada, nem mesmo por Emenda Constitucional, sendo imune, não existe fato gerador do tributo, logo, não existe obrigação tributária.

A imunidade tributária tem uma importância considerável no cenário jurídico brasileiro, que além da legitimidade adquirida pela interpretação que a jurisprudência tem lhe conferido, conta com o amparo magistral da Carta Magna de 1988. Entende-se, portanto, que as imunidades tributárias, como instrumento de garantias constitucionais, alcançam um espaço amplamente considerado, beneficiando diretamente a sociedade como um todo, e não somente os contribuintes que dela usufruem. As imunidades consideradas para as entidades filantrópicas alcançam o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), o Programa de Integração Social (PIS), o Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS) patronal e de terceiros.

O ISSQN é uma espécie tributária de competência privada ou exclusiva dos Municípios. Não obstante, no tocante ao Programa de Integração Social e Instituto Nacional da Seguridade Social, a espécie tributária é denominada residual, ou seja, nos moldes da Constituição, a União possui autorização expressa para instituir impostos e contribuições de seguridade social.

Há alguns anos, ocorrem conflitos sobre os requisitos para o efetivo gozo da imunidade tributária, por parte das entidades sem fins lucrativos. O inciso II do artigo 146 da Constituição assevera que cabe a Lei Complementar estabelecer exigências quanto ao poder de tributar, estabelecendo limitações constitucionais para tanto.

A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 156, inciso VI, alínea C, declara que a imunidade tributária atinge entidades de fins sociais e de caráter não lucrativo. Por outro lado, em seu artigo 195, parágrafo sétimo, define como isentas de contribuição para a seguridade social, as entidades beneficentes de assistência social. Conquanto, no curso do tempo, para a concreta obtenção da imunidade tributária das contribuições para as entidades filantrópicas, tornou-se necessário o cumprimento das exigências da Lei número 12.101/2009, que dispõe sobre a Certificação das Entidades Beneficentes de Assistência Social (Cebas).

Decerto, a Lei Complementar exige que o projeto de lei seja aprovado por maioria absoluta dos 81 senadores e 513 deputados. Nota-se que existe um meio de proteger os contribuintes, desde o início da criação da lei que trate de matéria tributária.

Após duas décadas de debate, o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional as ADIns 2.028, 2.036, 2.228, 2.621 e o recurso extraordinário 566.622, em 2017. Nesses julgados, o STF se posicionou de tal maneira a reconhecer como imprescindíveis para o gozo da imunidade tributária, apenas os requisitos estabelecidos pelo artigo 14 do Código Tributário Nacional. A decisão do Supremo trouxe vantagens para as entidades sem fins lucrativos, pois uma série de requisitos exigidos pelo fisco por meio de Lei Ordinária deixaram de ser exigidos, passando a vigorar apenas os pré-requisitos do CTN.

Neste mesmo contexto, em março deste ano, o Supremo julgou a ADI 4.480, que trata sobre o mesmo tema, versando sobre regras da Lei 12.101/2009, estabelecendo limites explícitos e sucintos quanto à legislação ordinária e complementar. Esse julgamento abordou as condições estabelecidas para a certificação de entidades de educação e assistência social. Alguns artigos foram declarados inconstitucionais, quais sejam: artigo 13, inciso III; parágrafo primeiro, inciso I e II; parágrafos terceiro e quarto, incisos I e II; parágrafos quinto, sexto e sétimo; artigo 14, parágrafos I e II; artigo 18, caput; artigo 31 e artigo 32, parágrafo I.

Em síntese, o STF afastou a totalidade da gratuidade das assistências sociais para obtenção da CEBAS, e por consequência, garantiu a imunidade tributária das contribuições.

Além da questão especificada, para a assistência social, o julgamento da ADI 4.480 afastou também os efeitos aplicados pelo artigo 31, que afirmava que as entidades teriam direito ao gozo da imunidade das contribuições somente após a obtenção do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social. Seguindo o mesmo paradigma da Súmula 612, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o STF entendeu que a concessão do CEBAS tem efeito retroativo a data de cumprimento dos requisitos fundamentais, ou seja, desde que se tenha obedecido às exigências impostas pela Lei Complementar.

Nessa linha de raciocínio, o CEBAS possui característica de ato declaratório, não podendo criar direitos, mas, apenas o fomento de um direito já estabelecido.

Torna-se imprescindível mencionar que as entidades que tiveram seus pedidos de certificação indeferidos por não atenderem aos comandos da Lei 12.101/2009, terão o direito de ter o CEBAS, inclusive poderão requerer a restituição dos pagamentos de contribuições sociais recolhidas para o fisco nos últimos cinco anos, conforme determina o artigo 168 do Código Tributário Nacional, haja vista o mais novo entendimento do STF no julgamento da ADI 4.480.

Ante o exposto, é notório o julgamento da ADI 4.480 quanto as novas demonstrações no tocante a compreensão do Supremo Tribunal Federal relativas as imunidades tributárias no terceiro setor. Torna-se necessário considerar outros julgados sobre o assunto, inclusive de instâncias inferiores, especialmente a inexigibilidade das exigências contidas na Lei 12.101/2009, para fins de obtenção do CEBAS e consequentemente, imunidade tributária pelas entidades filantrópicas.

É verossímil elucidar o julgamento pendente no Supremo Tribunal Federal que trata da imunidade sobre as contribuições sociais: a ADI 4.891 ponderada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Entretanto, uma posição arguta do STF acarretará na finalidade constitucional de ampliar a atuação das entidades filantrópicas do terceiro setor, a proporcionarem benefícios no âmbito da saúde para a sociedade no contexto atual.

 

Gleison do Prado de Oliveira. Graduado em Ciências Contábeis pela Unipar, especialista em Docência do Ensino Superior, Controladoria e Finanças pela Faculdade UNINA de Curitiba e bacharelando em Direito pela Unipar. É contador do Escritório de Contabilidade Silvestre & Degan de Umuarama.

Artigo está no jornal impresso de julho de 2020.

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