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Jornal Caderno Jurídico

ESPAÇO ACADÊMICO

A importância do juiz de garantias no Processo Penal

3/8/2021 às 1h05 - Matheus Urgniani
Divulgação Matheus Urgniani “Embora existam operadores do Direito contrários à referida mudança, influi-se que, com a instituição desse novo juiz, aumenta-se a possibilidade de se ter um julgamento mais imparcial”, observa o estudante Matheus Urgniani

Ano passado ocorreram algumas mudanças no ordenamento jurídico brasileiro, as quais trouxeram várias interpretações e discussões. Uma que ganhou destaque (entre juristas e população) foi o juiz de garantias, trazido pelo pacote anticrime, mas ainda com aplicação suspensa. Dada a novidade, abordaremos a importância do juiz de garantias e seu novo papel dentro do Estado Democrático de Direito.

A atuação do juiz de garantias será na fase investigativa da descoberta do delito, a fim de avalizar maior imparcialidade ao processo penal, pois ficará responsável por deliberar sobre as questões que surgirem durante a fase do inquérito policial. Desse modo, o magistrado responsável por proferir uma sentença penal não terá contato com a fase inquisitória, não formulando, consequentemente, um juízo de valor quanto à culpabilidade do réu antes de serem produzidas as provas processuais.

O Brasil é um Estado soberano, regido por uma Constituição que assegura direitos e garantias fundamentais. Para tanto, toma por base a democracia que se dá pela eleição periódica e pelo voto popular e universal. Essas características atribuem ao País o status de Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido, os três poderes e seus atores estão sujeitos à Constituição e as demais normas legais, as quais devem ser respeitadas a fim de evitar abusos por parte do Estado, limitando o poder exercido por ele. Nessa senda, o Estado tem seus poderes limitados aos deveres legais, pois é nessa medida que poderá exercê-lo, como forma de efetivar o que já está plasmado pela letra da lei, pelos princípios, planos, orçamentos, etc., obrigatoriamente, em busca do interesse público em face do privado.

Por isso, encontram-se no nosso ordenamento jurídico, garantias concedidas à pessoa que está sendo processada em juízo criminal, e é neste sentido que é necessário um juiz imparcial para julgar. Sobre essa necessidade, explica Rangel (2015), a imparcialidade tem como função “afastar qualquer possibilidade de influência sobre a decisão que será prolatada, pois o compromisso com a verdade, dando a cada um o que é seu, é o principal objetivo da prestação jurisdicional”.

Em qualquer julgamento criminal, é necessário um magistrado que julgue de forma mais imparcial possível, sob pena de não se cumprir com a função do ente mediador e decisor final das relações entre os cidadãos. Assim, é necessário que não se favoreça nenhuma parte para que não haja abuso de direito.

Hoje, a realidade processual é que “a defesa sempre está correndo atrás de um imenso “prejuízo cognitivo”. Ela sempre chega à fase processual em desvantagem e não raras vezes, já perdendo por um placar cognitivo negativo considerável, quando não irreversível” (RITTER; LOPES Jr, 2020).

Embora existam tentativas de garantir a imparcialidade no processo de formação de convicção do juiz, em razão do princípio da inércia e da imparcialidade da jurisdição, lembremo-nos que o juiz ainda é um ser humano, portanto sujeito as mesmas falhas e tendências que qualquer outro.

Além do mais, conforme expõe Ritter e Lopes Jr. (2020), “o juiz enquanto ser no mundo, também constrói imagens mentais a priori”, ou seja, antes da cognição definitiva, há uma valoração sumária, que poderá prejudicar todo o deslinde processual.

Diante disso, não é melhor que o magistrado que julgue seja distinto do que instrui? Ocorre na norma vigente que desde a investigação criminal o juiz julgador acompanhe todos os procedimentos realizados pela autoridade policial. Se necessitar de alguma diligência investigativa, como a quebra do sigilo bancário, busca e apreensão domiciliar e entre outras, terá que recorrer ao juiz julgador, para que venha autorizar tais atos, envolvendo o magistrado com o caso.

Vale ressaltar que o inquérito tem como característica o sistema inquisitorial, ou seja, em regra não há contraditório, nem ampla defesa, deixando o até então o investigado à mercê daquilo que a autoridade acredita como verdadeiro. Assim, podendo tal “verdade” contaminar o entendimento do juiz, que não será mais imparcial no momento em que for presidir a ação penal e dar sua decisão final.

Ora, se aquele que preside o inquérito coloca aquilo que ele crê, e fundamenta o seu pedido de interceptação telefônico com base naquilo que ele tem como provas até o momento, sem a parte contraditar, o juiz ficará totalmente influenciável. Dessa forma, será que o magistrado realmente começará a fase processual imparcial, após ter acompanhado uma fase ouvindo só uma parte?

Por isso, evitando dar margem ao erro e com fulcro na tão almejada imparcialidade, o pacote anticrime institui o juiz de garantias, a fim evitar abusos por parte do Estado, dando mais vazão, ao princípio da imparcialidade o qual terá mais oportunidade de prevalecer, efetivando também a presunção de inocência.

Embora existam operadores do Direito contrários à referida mudança, influi-se que, com a instituição desse novo juiz, aumenta-se a possibilidade de se ter um julgamento mais imparcial, evitando os possíveis abusos praticados pela autoridade judiciária, mantendo-se fiel ao Estado Democrático de Direito e seus princípios. Por isso, é de se louvar a instituição de tal garantia, restando a todos torcer para que não fique apenas no plano formal, mas venha se materializar.

 

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BRASIL. Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019. Aperfeiçoa a legislação penal e processual penal. Disponível em:  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13964.htm. Acesso em: 13 ago. 2020.

MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 13.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2003.

RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 23.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2015.

RITTER, Ruiz; Lopes JR, Aury. Juiz das garantias: para acabar com o faz de conta que existe igualdade cognitiva. Revista Consultor Jurídico. 09 de maio de 2020. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2020-mai-08/juiz-garantias-fim-faz-conta. Acesso em: 13 ago. 2020.

 

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Artigo escrito em agosto de 2020 por Matheus Henrique de Freitas Urgniani, bacharelando em Direito e participante do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica, o PIBIC da Unipar, câmpus Umuarama/PR. Escreva para matheus.urgniani@edu.unipar.br.

Artigo desenvolvido sob orientação do advogado e professor dos cursos de graduação e pós-graduação da Unipar, Alessandro Dorigon, mestre em Direito Processual e Cidadania e especialista em Docência e Gestão do Ensino Superior.

Publicado no jornal impresso de julho de 2021, página 7. Acesse também www.jornalcoluna.com.br.

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