Direito Imobiliário
Plano diretor do município e as imobiliárias
Qual a importância dos incorporadores, imobiliaristas, corretores e loteadores participarem da elaboração do Plano Diretor do Município, leis de uso e ocupação do solo e demais instrumentos de gestão urbana?
A esta pergunta, muitos responderão: “porque é importante o corretor ou loteador saber para onde o município irá crescer e onde se farão as obras de infraestrutura e atendimento à população. E essas informações são importantes para sabermos onde iremos fazer nossos investimentos”.
Entretanto, aqueles profissionais do setor imobiliário que estão com esta visão, podem estar cometendo um erro enorme de posicionamento quanto a Política Pública Municipal de Uso e Ocupação do Solo. Consequentemente, perdendo a oportunidade de valorizar seus investimentos e, na verdade, de todos que possuem imóveis no município.
Os corretores e profissionais da área de construção e loteamento são dotados de muito conhecimento e experiência a respeito dos melhores modelos e soluções para o desenvolvimento urbano. Infelizmente, não são poucos os municípios em que a participação desses profissionais é muito pequena na elaboração das Leis do Plano Diretor e de Uso e Ocupação do Solo Urbano.
A sua participação poderia influir diretamente nos projetos a serem desenvolvidos e resultar num município com imóveis, ruas e bairros mais inteligentes, consequentemente, mais atraentes a investidores locais e externos. Evidente que esta participação implicaria diretamente na valorização dos imóveis e, portanto, todos estariam ganhando com essas informações.
Outra vantagem seria o conforto e maior praticidade que pode resultar no uso dos imóveis e bairros elaborados com a participação destes profissionais.
Convém, ao tratar deste assunto, combater um preconceito gerado no mundo político e imobiliário quando se fala em participação empresarial na elaboração das políticas públicas.
Ao sugerirmos que os profissionais de imobiliárias, construtoras, loteadoras e incorporadoras tenham uma maior participação na elaboração do Plano Diretor Municipal e na Lei de Uso e Ocupação do Solo, muitos podem pensar: “os empresários irão fazer lobby com os vereadores e o prefeito e fazer a cidade crescer em direção aos terrenos onde eles têm investimentos”.
Ou seja, mais uma forma de corrupção no nosso país.
É bem da verdade que esta situação descrita existe nos nossos municípios e, infelizmente, com frequência. Entretanto, não é esse tipo de sugestão que estamos fazendo. A ideia aqui é justamente para evitar este tipo de lobby.
A proposta é uma participação transparente, igualitária e técnica.
Transparente, porque será dentro do processo de elaboração do Plano Diretor e demais leis de gestão urbana, com a participação popular e a devida fiscalização.
Igualitária, porque um empresário específico não terá mais força que outro cidadão qualquer. Ele será um contribuinte ao planejamento e suas ideais serão analisadas como a de outros participantes.
Técnica, pois os empresários do setor realmente são capazes de fazerem ótimas sugestões que podem beneficiar toda a comunidade municipal.
O desenvolvimento econômico de um município depende de diversos fatores: escolaridade da população, região do país, recursos naturais, infraestrutura de escoamento e recepção de mercadorias e, entre outras, o planejamento que o município faz para o seu desenvolvimento futuro.
Esse planejamento tem como componente essencial a estrutura que irá se estabelecer para o uso e ocupação do solo urbano. Quanto mais bem elaborado e com uma visão de futuro a longo prazo, maiores as chances deste município crescer e melhores serão os resultados para aqueles que ali “apostaram suas fichas”.
Vale lembrar que o Plano Diretor irá determinar os caminhos que o município irá seguir num intervalo de 10 anos, tempo suficiente para planejar e realizar muitas obras importantes para o desenvolvimento municipal.
Em paralelo ao Plano Diretor o município poderá desenvolver as chamadas operações urbanas consorciadas, que, segundo o artigo 32 do Estatuto das Cidades (Lei Federal 10.257/2001) são:
§ 1º Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental.
Percebam a importância deste dispositivo legal, pois ele permite alterações no planejamento de determinadas áreas para alcançar os objetivos de transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental.
Transformações urbanísticas estruturais referem-se às mudanças no planejamento urbano que podem promover alterações no sistema viário, nos equipamentos públicos e até mesmo no destino da Zona de Planejamento do Plano Diretor.
Exemplifiquemos: próximo a um bairro residencial instala-se uma indústria de grande porte. Ora, com essa nova realidade, talvez o melhor para a região seja alterar o destino da área e transformá-la numa nova zona industrial ou comercial.
As melhorias sociais podem implicar nas mais diversas alterações num determinado bairro ou zona de planejamento.
Por exemplo: um bairro com problemas de violência e tráfico de drogas pode ser transformado e elevada a qualidade social com mudanças no planejamento e a facilitação da instalação de empresas privadas e equipamentos municipais de atendimento à população.
Por fim, a valorização ambiental também é um desenvolvimento que pode ser realizado em parceria entre os agentes descritos no parágrafo acima. Podemos pensar, como protótipo, em um projeto de criação de jardins verticais nos edifícios de um bairro central com estímulo por meio de redução do IPTU proporcionalmente à área verde implantada.
Cabe lembrar que a valorização ambiental é diretamente proporcional à valorização imobiliária da região.
No mesmo artigo 32, parágrafo 2º, são descritas sugestões de tipos de operações urbanas consorciadas. São elas:
I – a modificação de índices e características de parcelamento, uso e ocupação do solo e subsolo, bem como alterações das normas edilícias, considerado o impacto ambiental delas decorrente;
II – a regularização de construções, reformas ou ampliações executadas em desacordo com a legislação vigente e;
III – a concessão de incentivos a operações urbanas que utilizam tecnologias visando a redução de impactos ambientais, e que comprovem a utilização, nas construções e uso de edificações urbanas, de tecnologias que reduzam os impactos ambientais e economizem recursos naturais, especificadas as modalidades de design e de obras a serem contempladas.
A leitura atenta desses institutos permite vislumbrar que eles são a permissão da realização dos exemplos de alterações supracitados e, definitivamente, como os profissionais do setor imobiliário são essenciais para sua aplicação. Isto porque, com o passar do tempo, os bairros e zonas de planejamento passam por fenômenos que não estão previstos nos Planos Diretores ou Leis de Uso e Ocupação do Solo, o que pode implicar em uma deterioração do ambiente e prejuízo aos moradores e empresários. Neste caso, os atuantes no setor imobiliário são os agentes capacitados que estão acompanhando essas transformações e podem propor as melhores medidas para reverter o quadro e manter ou aumentar o valor dos investimentos que foram realizados pelos proprietários e poder público na região.
Enfim, setor imobiliário + Plano Diretor Municipal = fórmula de sucesso.
Esperamos que tenham gostado do artigo. Na próxima semana iremos dissertar sobre a função social da propriedade. Até.
Ingrid Cristine Zanella é advogada com atuação especializada em Direito Ambiental e Imobiliário. Escreve para ingridzanella.advocacia@gmail.com.
Artigo publicado no jornal impresso de setembro de 2019.