ESPAÇO ACADÊMICO
As implicações do discurso político demagógico no Direito Penal Simbólico
Olá leitores! Chegamos ao final de mais um ano! Muito bom ter escrito artigos e compartilhado ricos conhecimentos com vocês. É de grande importância à nossa vida estudantil ter a oportunidade de participar com frequência do Espaço Acadêmico neste conceituado jornal. Agradeço a Deus e a minha família. Agradeço aos professores pela orientação, em especial ao doutor Luiz Roberto Prandi. No último artigo do ano escrevemos sobre os efeitos do discurso político demagógico no Direito Penal Simbólico. Conforme o grau de insatisfação da população, propostas assim mostram-se como uma isca sedutora para a conquista do voto. Vamos ler!
Entende-se como demagogia a habilidade de manipular os interesses populares por meio de promessas legislativas que, atendendo aos anseios do eleitorado, visam tão somente à obtenção de seu voto.
Tal prática, mais frequente no período eleitoral, não se limita a um espectro político. Não obstante as disparidades ideológicas, todos os candidatos utilizam-se da técnica do discurso político demagógico objetivando chegar ao poder (ou permanecer).
Nestes discursos, as propostas nunca estão acompanhadas de estudos mais aprofundados acerca do problema em debate. Na maioria das vezes, inclusive, dizem respeito à segurança pública e surgem como fórmulas mágicas.
Assim, o discurso demagógico é eficaz para o objetivo proposto – isto é, a obtenção de voto – pois, na maioria das vezes, o voto do homem médio não é um ato racional. Mas sim um voto com fortes nuances emocionais.
O que motiva o eleitor a sair de casa em pleno domingo para votar, além da obrigatoriedade e coação do Estado, é a esperança, ainda que residual, de melhorar sua qualidade de vida.
Sabe-se que a qualidade de vida de uma nação acontece por meio de políticas econômicas, planejamento e administração. Contudo, aos ouvidos do homem médio não interessam expressões como corte de gastos, privatização, reequilíbrio do orçamento e diminuição da máquina pública. O que preocupa o eleitorado, de modo imediato, é a violência. É o medo, por exemplo, de ser brutalmente assassinado numa tentativa de assalto, ser atingido por uma bala perdida ou saber que sua filha pode ser violentada.
Os políticos sempre souberam que o eleitor tende a depositar confiança, e por consequência seu voto, nos candidatos cujas propostas aparentem ter efeito imediato e radical sobre determinado problema. Ainda mais quando este problema diz respeito à insegurança da população.
E, quando um fato relacionado ao problema está em evidência, em razão da exposição midiática, o clamor popular torna-se um ‘prato cheio’.
Como consequência destes discursos, há o aumento injustificado de penas e a inclusão de novos tipos penais em nossa legislação criminal, baseados na ideia errônea de que a criação de leis penais podem acabar com os conflitos sociais.
Essa prática causa implicações graves no campo do Direito, gerando o que os autores se habituaram a chamar de Direito Penal Simbólico, que ocorre quando o legislador promete/fomenta/elabora leis que saciam, de imediato, um desejo coletivo de vingança e repressão, mas que, na verdade, não surtem efeito algum sobre o problema quando promulgadas.
Resulta, todavia, em figuras penais desnecessárias, causando uma hipertrofia do sistema penal, cuja maior consequência é a perda da sua credibilidade.
Assim, do mesmo modo que na Medicina cada doença possui um tratamento, no estudo da Criminologia sabe-se que cada crime possui uma potencial solução de acordo com a sua causa. E, dentre as soluções em potencial, com certeza, não está a Lei Penal.
Dizer que umas das finalidades da pena é a prevenção geral e, por isso, Lei Penal é sempre eficaz para se evitar o cometimento de outros crimes, trata-se de mera falácia retórica. A pena age no sintoma, não na causa.
Não se resolve o problema da violência e da criminalidade com Lei Penal. Pelo contrário, utilizar-se desse instrumento, a torto e a direito, produz justamente os efeitos contrários ao esperado.
Neste sentido, ainda que a priori pareça paradoxal, a inflação legislativa é condutora da sensação de anomia, pois quanto maior o número de normas, maior, também, a impressão de ausência de leis por conta da não diminuição da criminalidade.
A inflação legislativa viola, ainda, um princípio basilar do Direito Penal que é a intervenção mínima, pois, o Direito Penal só deve preocupar-se com a proteção dos bens mais importantes e necessários à vida em sociedade. Deve-se utilizar a Lei Penal tão somente quando os outros ramos do Direito não mais tutelarem os bens jurídicos em conflito.
Observe-se que, desde 1940, o legislador brasileiro reformou nossas leis penais mais de160 vezes.
Também é óbvio que nada obsta uma ideia ser, concomitantemente, sensata e popular. É preciso ter cautela para não se taxar de demagogo um ideal tão somente pelo fato de não agradar e estar “na boca no povo”.
Há, também, algumas ideias e propostas que apesar de necessárias e acertadas, são difundidas pelas razões erradas e, por isso, acabam sendo desvirtuadas e utilizadas no discurso político demagógico. É o que ocorre, por exemplo, com redução à maioridade penal que, tal como a pena de morte, tornou-se uma pauta perfeita para discursos demagógicos, pois os debates são pautados na emoção e no medo, e não na lógica, como deveria ser.
Conforme o grau de insatisfação da população, propostas assim mostram-se como uma isca sedutora para a conquista do voto.
Por isso, caro leitor, devemos estar sempre atentos ao ouvir um discurso político. Precisamos estar cientes que as pessoas são movidas por interesses particulares. E o interesse do candidato, em geral, é estar no poder. Desta forma devemos desconfiar de propostas radicais, fórmulas mágicas, soluções imediatas e, principalmente, discursos carregados de emoção.
Certamente essas propostas imediatistas não surtirão efeito algum sobre os índices de violência. Farão, no máximo, com que o candidato seja eleito e que após, conseguir promulgar alguma lei, esta apenas causará inflação legislativa e sensação de anomia.
Escrito por Lucas Marin Cebrian, bacharelando em Direito e participante do Programa de Iniciação Científica (PIC) da Universidade Paranaense, UNIPAR, Campus Umuarama/PR. O acadêmico é assessor de gabinete da Defensoria Pública da União (DPU), unidade de Umuarama.
Artigo elaborado com a orientação do professor Luiz Roberto Prandi, mestre e doutor em Ciências da Educação, conferencista, pesquisador, autor de livros, professor titular e pesquisador da UNIPAR e colunista do Caderno Jurídico.
Publicado no jornal impresso de dezembro de 2017.