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Jornal Caderno Jurídico

ESPAÇO ACADÊMICO

Gestão pública ineficaz, a endemia brasileira

18/2/2017 às 20h12 | Atualizado em 20/2/2017 às 11h34 - João Vitor Gimenes Souza
João Vitor Gimenes Souza

Não é de hoje que se observa em nosso país a doença da ineficácia que vem se alastrando cada vez mais e atingindo todos os âmbitos imagináveis da gestão pública, fazendo com que os serviços se tornem ineficientes e deixem de atender às necessidades do Estado e da nação em modo geral.

Os exemplos são quase infindáveis, mas aqui mostrar-se-á apenas dois casos que aconteceram recentemente. A economia, que estava indo bem, mas a falta de firmeza do governo nas relações internacionais e de uma infraestrutura adequada para manter o bom nível do comércio internacional, fez o Brasil cair uma posição no ranking das maiores economias do mundo (de sexto para sétimo lugar).

A gestão pública sofre com a patologia da ineficácia. Mas o que seria realmente essa doença que está tão entranhada na vida dos brasileiros, o que a nutri com tanta força para que ela consiga minar com tanta precisão o futuro da nossa nação e qual a possível cura para a mesma?

A doença

A doença não está isolada na Copa do Mundo, na saúde, nos transportes, na comunicação ou em qualquer outro setor, mas sim alastrada por todos os setores, o que a torna endêmica. Não haveria problemas como os que existem no Brasil se nossos impostos (muito altos em vista a qualidade dos serviços repassados pelo governo aos cidadãos) fossem realmente usados pela gestão pública com responsabilidade e interesse.

Apesar de a gestão ter melhorado e conquistado mais agilidade nos últimos anos ela ainda está longe de ser eficaz, pois mesmo estando dispostos no artigo 37 da Constituição Federal os princípios para nortear o ato da gestão (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência) ainda se perde no emaranhado das enormes dificuldades para a sua praticidade.

Nota-se que a gestão pública carece de uma linha de crescimento racional e evolutivo, criando uma base de desenvolvimento forte que possa suportar o peso do progresso.

Pelo exposto anteriormente vemos o governo apostar em um futuro utópico, através de uma gestão equivocada, querendo por em prática um projeto de trem bala, enquanto os serviços básicos e necessários à população deixam de ser prestados de maneira honesta e eficaz.

Os números das pesquisas realizadas deixam o cenário ainda mais tenso, pois enquanto pensam em fazer um trem bala tem-se, entre outros fatos preocupantes, 25% da população sem acesso ao saneamento básico, nosso sistema de esgoto deixa de atender 55% da população e nosso modelo de segurança pública é arcaico e carrega-se o peso de 50 mil assassinados por ano.

Os princípios que estão em nossa Carta Magna são nomeados como normas programáticas, pois eles norteiam as atuações do governo e de seus órgãos para atender as exigências criadas pelos constituintes. Mas aqui sobressai outra questão interessante, pois diferentemente do cidadão, que pode fazer tudo que a Lei não o proíba, os governantes só podem agir dentro do que a Lei permite (princípio da legalidade).

Os gestores públicos devem fazer sua gestão cumprindo com o disposto no artigo 37 da Constituição, mas devido à falta de uma Lei Complementar que especifique tais princípios, cria-se certa dificuldade para julgar aquilo que cumpre ou não ao Estado executar, criando assim um empecilho para instaurar processos de improbidade administrativa e punir os maus gestores.

O Princípio da Impessoalidade diz que o gestor deve agir sempre para o atendimento geral e impessoal da população, mas os casos de licitações fraudulentas são, de certa forma, uma regra.

O Principio da Moralidade visa garantir uma administração honesta e benéfica com uma distinção entre o honesto e o desonesto dentro de uma moral jurídica, mas ainda há casos em que os gestores públicos agem com má fé.

O Princípio da Publicidade traz a ideia de que todos os atos da gestão pública devem ser divulgados e informados, mas ainda assim empréstimos e concursos públicos são feitos de forma nada transparentes.

Por último, e não menos importante, tem-se o Princípio da Eficiência, que sugere a ideia de uma gestão sem amadorismos que busque o melhor resultado possível com o melhor custo benefício que pode ser alcançado, mas mesmo assim, muitas obras que após serem entregues já sofrem com problemas estruturais.

Pelo que o que foi exposto o leitor pode compreender que a gestão pública nacional carece de uma linha de ação racional e principalmente de um maior cumprimento de seus princípios, pois nem nas obras e serviços que o governo diz que se empenha com eficácia mostra bons resultados (vide a transposição do Rio São Francisco e as demais obras atrasadas do PAC).

 

O que nutre a doença

A falta de uma gestão pública mais dinâmica se mantém como uma doença devido a muitas influências, mas deve-se elencar aqui os quatro principais nutrientes que mantém tal patologia.

Primeiramente, a falta de uma educação de qualidade que seja bem estruturada, livre de tendências ideológicas e que realmente ensine o aluno a pensar e a por em prática seus conhecimentos, que ajude a prepará-lo para a vida civil, que lhe de cultura, informação e capacidade técnica e intelectual.

Em segundo lugar, têm-se a degeneração dos políticos que, com o passar dos anos, passaram a governar cada vez mais a favor de seus interesses partidários e abandonarem a praticar da real política (aquela do mundo grego, que remete os procedimentos relativos à polis) para aplicar uma politicagem baixa e mesquinha por puro jogo de interesses.

No terceiro lugar, aparece a degeneração dos cidadãos em modo geral (que em grande parte são incultos) que apesar de criticarem os governantes não tomam as providências necessárias que permita mudar o status quo (começando por si mesmos, já que o governo de um país é o reflexo de seu povo).

E por último, mas não menos importantes que os demais, a falta de agilidade e de uma boa estrutura para que o sistema judiciário possa passar para a população uma sensação de legalidade; mas o acumulo de processos é muito grande (vide o julgamento do mensalão que se arrastou por anos antes de terminar), e tudo volta a um sistema de ciranda.

 

Uma possível cura

Curar a falta de eficácia na gestão pública é algo muito complicado, devido aos inúmeros fatores e suas mútuas correlações que a deixa nessa situação indesejável. Por exemplo, como não relacionar a falta de uma boa educação com a falta de gestores com maior competência e capacidade técnica? A relação é imediata e verdadeira! A situação é delicada e a cura só vira em longo prazo.

A educação deve ser reestruturada em todos os níveis. Ela fornece os ensinamentos e as capacitações necessárias não só para uma gestão pública eficaz como também para todos os tipos de profissão que exija capacitação técnica.

A lentidão e a falta de estrutura do sistema judiciário ajudam a debilitar a eficácia da gestão, pois a imensidão de ordenamentos públicos para serem analisados, somados com a falta de estrutura para cumprir tamanha demanda, gera um grande atraso no processo legal dos processos de improbidade administrativa.

Nasce dessa lentidão uma tensão quase explosiva que se arrasta junto com o processo: se o gestor acusado de cometer um erro na gestão é inocente, passa anos em julgamento para provar sua inocência; se o gestor é culpado, nasce à sensação de impunidade, visto que a espera de anos para que a punição seja decretada. Melhorar a estrutura jurídica nacional trará melhorias excepcionais à gestão pública.

Os governantes precisam fazer de tudo para garantir aos cidadãos as condições de uma concorrência justa entre todos, ou seja, garantir aquilo que é de direito de cada cidadão e que está escrito em nossa Carta Magna. Devem fazer o máximo para que os cinco meses do ano que o cidadão brasileiro trabalha para pagar impostos retorne da maneira mais eficaz para atender suas necessidades.

À nação, cabe o papel fundamental numa democracia: fazer, através do voto, uma ordem de instituições existentes e imediatas pela alternância de seus representantes no poder. Representantes que realmente tenham capacidade para ocupar um lugar no governo e que representem, de maneira digna, o povo que o elegeu, o que não se vê no Brasil atual.

Cabe à nação não eleger indivíduos que não tenham capacidade para participar da gestão pública, mas aqui isso é o que mais acontece. E o pior de tudo é que, mesmo tendo uma gestão deficiente, os políticos são reeleitos. O povo precisa mudar e começar não só a renovar seus representantes, mas também exigir que a gestão pública seja mais eficaz.

Conclui-se que a melhoria desses quatro fatores, a longo prazo, daria ao Brasil uma gestão pública descente e admirável. Com isso, receber-se-ia melhorias em todas as áreas. Afinal, todo serviço público necessita passar por uma gestão e se essa for eficaz, irá garantir bons retornos e serviços aos cidadãos.

 

João Vitor Gimenes Souza é acadêmico do curso de Direito da Universidade Paranaense (UNIPAR), Campus Umuarama/PR.

Artigo escrito com a orientação do professor Luiz Roberto Prandi, doutor em Ciências da Educação (UFPE). Mestre em Ciências da Educação (UNG/SP). Especialista em Gestão Escolar, Supervisão e Orientação Educacional, Gestão e Educação Ambiental, Educação do Campo, Metodologia do Ensino Superior. Autor de livros, professor titular e pesquisador da UNIPAR e conferencista.

Publicado no jornal impresso em julho de 2014.

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