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Jornal Caderno Jurídico

Educação

E possível escola sem partido?

18/2/2019 às 20h54 | Atualizado em 18/2/2019 às 21h07 - Helton Kramer
Divulgação Helton Kramer Para o professor Lustoza, o excesso de proteção não emancipa a educação. Ao contrário, infantiliza os alunos. “E o caminho não é retirar a liberdade de ensino.”

Uma das principais polêmicas no meio acadêmico é o crescimento de adeptos ao Programa Escola sem Partido. Trata-se de um movimento iniciado em 2004 no Brasil e divulgado em todo o país pelo advogado Miguel Nagib. Em linhas gerais, o movimento defende a proibição da chamada “doutrinação ideológica” nas escolas (ebc.com.br).

São vários projetos de lei que trazem as ideias deste movimento. Dois deles aguardam tramitação no Congresso Nacional. Em todos existem uma série de proibições para os professores das escolas públicas e privadas, como promover suas opiniões, concepções, preferências ideológicas, religiosas, morais, políticas e partidárias.

Em contraposição, professores, estudantes e juristas, criticaram o programa Escola sem Partido, em razão de que representaria uma restrição à liberdade de expressão e prejudicaria a plena formação nas escolas de todos os níveis. A crítica se baseia exatamente no sentido em que nada na sociedade é isento de ideologia e que o Escola Sem Partido, na verdade, é uma proposta carregada de conservadorismo, autoritarismo e fundamentalismo cristão.

Reconhecemos que existe legitimidade em exigir a responsabilidade dos professores, de todos os níveis de ensino, para que promovam o aprendizado dos alunos de forma consciente e autônoma. Falo enquanto professor que é um dever do docente preparar os alunos inspirado na liberdade de pensamento, deixando-os aptos ao exercício da cidadania e qualificados para o mercado de trabalho (artigo 2º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional). E neste percurso, devemos ter ética e permitir que o educando possua liberdade em formar suas próprias convicções sobre o conteúdo repassado. A “hierarquia” existente entre professor e aluno não significa submissão total e irrestrita, sendo que o aluno tem a possibilidade de concordar ou discordar dos entendimentos predominantes, dentro da concepção democrática e respeitando uma argumentação racional.

Existe legitimidade em exigir a responsabilidade dos professores para que promovam o aprendizado dos alunos de forma consciente e autônoma.

Em vários momentos tomei conhecimento de casos nos quais professores impuseram aos alunos questões ideológicas, proibindo manifestações contrárias. Claramente, agindo desta forma, o docente estará subvertendo a finalidade educacional, mas não se acredita que a solução consista em levar essa subversão a seu extremo e transformar o aluno em fiscal do professor. Quem analisaria os limites entre o que é uma discordância/reflexão e um assédio intelectual ou doutrinação?

Assim, a existência de uma lei proibindo que o professor tenha liberdade de cátedra em ministrar o conteúdo, segundo a doutrina que melhor se adapta à sua disciplina, não parece ser a melhor solução.

Notamos que a liberdade de consciência, neutralidade política, ideológica e religiosa do Estado e pluralismo de ideias são diretrizes que já existem, pois decorrem da Constituição Federal e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Isso significa que os professores já são obrigados a respeitá-las.

Mas também devemos enxergar que a liberdade de cátedra ou liberdade acadêmica é um princípio que assegura a autonomia de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento (artigo 206, II CF). É através dessa liberdade que o pluralismo de ideias e concepções no ensino ocorrem, sem que haja imposição ou censuras, ocorrendo naturalmente.

Acreditamos que o excesso de proteção não emancipa a educação. Ao contrário, infantiliza os alunos. Entendemos que o caminho não seja retirar a liberdade de ensino. Confiamos que o viável é que ocorra a formulação de políticas públicas adequadas. É nesse sentido que concordamos com o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Luis Roberto Barroso, quando afirma que “(Os professores) têm um papel fundamental para o avanço da educação e são essenciais para a promoção dos valores tutelados pela Constituição. Não se pode esperar que uma educação adequada floresça em um ambiente acadêmico hostil, em que o docente se sente ameaçado e em risco por toda e qualquer opinião emitida em sala de aula”.

 

Helton Kramer Lustoza é Procurador do Estado do Paraná, professor e coordenador do curso de pós-graduação em Direito Administrativo e Municipal da Unipar, câmpus Umuarama/PR, autor do livro “Eficiência Administrativa e Ativismo Judicial” (editora Ithála), especialista em Direito Tributário, professor da Universidade Positivo e professor convidado do COTEF-RJ, ESAF e ESA-OAB.

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